27 de agosto de 2010

Perfeita Simetria

Ele estava cansado das brigas constantes, estava cansado das horas perdidas ao telefone discutindo bobagens ou, as vezes pior, horas de contato frio, como se fossem duas pessoas que não se conheciam - não de fato, não ainda.

Ele sabia que o devaneio que a irritara e, por certo, a magoara também, não havia sido nada senão a gota d'água que fez o pote transbordar. Mas e então, o que veio antes ao ponto de encher o pote? Ele não sabia.

Ele não podia achar que Luiza era um ex-amor, porque de fato e pesarosamente nunca viveram um amor juntos, foram parceiros. Mas ele a amava, cada gesto dela, cada sorriso incrivelmente incrível, cada palavra tão doce quanto algodão doce, cada uma das dúzias de fotos que ela tinha espalhadas em murais em seu apartamento.

Ele amava cada detalhe de Luiza, e a dor que o afligia era deveras forte em saber que os anos se passariam e ela ia acabar esquecendo dele - ou não. Não suportava imaginá-la casada com outro, com uma casa enorme e um casal de filhos, viajando por cada cidadezinha e outras tantas cidades grandes país afora.

Esses planos eram seus, eles haviam sonhado juntos. Jamais iria acusá-la de traição, ela estava em busca de realizar os sonhos de quando era jovem. E os sonhos dele, agora, eram repletos de aflição porque ele a queria de volta.


Abraço. Boa leitura.

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"Ao tempo em que nada
Nos dividia
Havia motivo pra tudo
E tudo era motivo pra mais
Era perfeita simetria
Éramos duas metades iguais"
(Perfeita Simetria - Engenheiros do Hawaii)

19 de agosto de 2010

Caçador Caçado

José abriu a temporada de caça, como ele chamava a hora de ir se divertir nas boates daquela cidade que parecia nunca dormir. Depois de um bom banho vestiu com as tradicionais etiquetas da moda, o tênis da Nike e usou um pouco daquele perfume da Carolina Herrera que as meninas não resistem.

Pegou escondido as chaves do carro do pai, que chamava muito mais atenção que o próprio. Foi pra o posto de gasolina onde era costume os jovens de sua idade se divertirem, e lá fez questão de comprar o mais caro uísque disponível, isso pra esbanjar que estava com muita grana - da carteira do pai.

Lá já intimou três meninas, daquelas que não podem ver um som alto e uma garrafa de uísque, que já pensam: "Hoje eu pego esse!"

Saiu pra boate, com as três. Pagou pra todas, entradas, bebidas, drogas, tudo mesmo. No fim da noite os papéis se invertem. É a vez delas pagarem, mas como não têm grana, pagam com sexo. José - e aí de quem chamá-lo de "Zé" - fatura as três. A caçada foi um sucesso.

Hora de ir pra casa. No caminho, cruza um sinal vermelho e encontra um caminhão no caminho. Morrem os quatro.


Abraço. Boa leitura.

12 de agosto de 2010

Eu tenho um segredo para te contar, sonhei contigo na noite passada. Fiquei bastante surpreso não por ter sonhado, mas pela essência do sonho.

Você estava ao meu lado, não era um daqueles clichês hollywoodianos, nem era um daqueles casamentos politicamente corretos. Era algo muito parecido conosco, pelo menos eu acho. Seu sorriso me aparecia mais fantástico, para não dizer incrível, do que em qualquer outra vez que eu tenha o visto, ou mesmo sonhado com ele. Aì me bateu saudade, e depois culpa.

É, culpa. Uma culpa irracional, naquela noite há 5 anos, quando você me deixou sem sequer se despedir, e nos meses seguintes em que não respondia minhas cartas, me senti culpado, mas era algo irracional eu não sabia porque sentia tal culpa.

Foi então que ele fechou os olhos, prendeu o ar, sonhou, e continuou sendo um sonho qualquer.
Um sonho, uma pena...


Abraço. Boa leitura.

10 de agosto de 2010

Monotonia Pressentida

Eduardo acordou cedo, fez o café e enquanto fritava ovos com bacon teve a estranha sensação de que não seria um bom dia no trabalho. Ligou a TV em busca de algum sinal, e nada. Ligou o rádio, e ainda nada. Mais uma vez só podia ter razão em seus pressentimentos. Fez a comida, comeu e depois levou uma bandeja pra namorada que ainda dormia no quarto. Não quis acordá-la, lhe escreveu um bilhete e saiu para trabalhar.

No caminho, nada mudou. As mesmas caras na porta do prédio, o mesmo barbeiro na barbearia da esquina, o mesmo velhote vendendo café ao lado do seu trabalho. Tomou um café, acendeu um cigarro, e ficou pensando. Enxergou lá longe umas nuvens cinzas era o agouro que lhe faltava. Subiu para sua sala, e deu início ao seu frenético ritmo de trabalho.

Ficou cerca de uma hora encarando a tela do computador tentando encontrar as palavras certas para escrever. Procurou, procurou, e nada. Fitava o papel e sentia um estalo, uma claque, mudos. E de repente um silêncio ensurdecedor. Chegou a hora do almoço e praticamente não tinha escrito uma só palavra. Foi almoçar.

Na volta, mal sentou-se novamente na frente do computador, foi interrompido pelo seu chefe. Que esbravejou-lhe dizendo que ele precisava mudar a forma de tratar as situações, a editora responsável pela revista havia recebido o quinto processo por danos morais em menos de dois meses. Todos em matérias escritas por ele.

De forma serena manteve o emprego, afinal precisava pagar as contas no fim do mês. E no fundo aquela rotina lhe agradava. O tempo passou, e ele foi se sentindo preso. Um dia ficou de saco cheio. "Já chega de tanta loucura, tanta vaidade. Eu so quero a verdade. Escrita em uma folha de papel reciclado usando um lápis sem tinta". Escreveu, não se demitiu, mas conseguiu ser promovido.


Abraço. Boa leitura.

9 de agosto de 2010

Microconto #7 e #8

Sutilmente

Eduardo queria acabar o namoro, chamou a namorada pra um café, mas não sabia o que dizer. E gritou pra garçonete:

- Moça, eu quero um café e um amor. Quentes, por favor!



Falta de Ar

Durantae a viagem Julia estava se sentindo esquisita, sentia culpa de algo que fizera, mas definitivamente não sabia o que era. Instantes depois o telefone toca, era Raul, seu marido, reclamando que estava sendo despejado porque ela gastara o dinheiro dos últimos cinco meses de aluguel com roupas, maquiagem e viagens.


Abraço. Boa leitura.

5 de agosto de 2010

Planos, planos, planos...

O mundo é mesmo um moinho, uma engrenagem de torre de relógio, algo incrivelmente fantástico e que funciona, porém...

Não importa o quanto sejamos capazes de planejar, de nada vale se não pudermos agir. De repente, vai chegar uma hora que vamos chegar na frente do espelho e perceber que as coisas estão erradas, e que não adianta tentar consertar o relógio quebrado, ele não voltará a funcionar.

E sabe o que acontece, é justamente parados diante do espelho numa noite qualquer que descobrimos que alguns planos não passam de idiotices. Em qualquer sentido que isso possa tomar, planos de beber num domingo de férias com os amigos de infância, planos de escrever um livro, planos de visitá-la no seu aniversário...

Planos, planos, planos...

Olhando ao redor, olhando bem, a verdade é que só vale a fé que cada um deposita em si mesmo, e ponto. Não duvido das pessoas e se acontecer algo que me deixe triste, não enxergo maldade, tem explicação. Algumas vezes não me importa a tal explicação, não vai mudar nada. Outras...

Agora me falta um vinho forte e um samba na vitrola, amanhã talvez me falte o vinho novamente, mas o samba se faltar eu invento.


Abraço. Boa leitura.