30 de junho de 2011

Pérola

Mais um dia de trabalho chegava ao fim, não suportava mais a rotina. Casa, trabalho, casa. Precisava de diversão, de ausência de responsabilidades e sabia que nunca mais teria isso como nos tempos em que fora jovem. Jogou-se na cama e encarava o teto, foi quando o telefone tocou.

Espantou-se imediatamente, era uma mensagem de texto de Pérola. Abriu, mas para seu lamento estava corrompida mensagem, algo havia dado errado no envio. Ele telefonou para ela, o celular estava desligado. Ficou intrigado, não esperava que ela lhe mandasse uma mensagem.

Tentou mais algumas vezes telefoná-la, em vão. Voltou para a cama e ficou mais uma vez encarando o teto. Agora ela ocupava sua mente, mas muito mais que qualquer traço que ela carregasse ele afundava seus pensamentos naquele sorriso que ela carregava, doce, tão doce. Da janela veio um vento, um tanto quanto frio.

E ele já quase dormia quando o celular toca novamente. Dessa vez uma mensagem da operadora, avisando que ela tinha ligado o celular. Ele ligou, imediatamente. Ela atendeu já dizendo que seu celular havia descarregado e perguntando da mensagem. Ele pode sentir um certo alívio do outro lado da linha quando disse que a mensagem havia chegado corrompida, ilegível.

Ele então perguntou o que estava na mensagem e ela disse que não era nada importante, em seguida disse que precisava desligar, já era tarde e ela trabalharia amanhã cedo. Ele desligou com uma curiosidade infindável. Do outro lado, ela sorriu pois a mensagem dizia justamente que ela queria apenas ouvir a voz dele.


Abraço. Boa leitura.

27 de junho de 2011

Lembranças, Disfarces e Reviravoltas... - Minissérie #1

Luiz caminhava lentamente até a boate onde trabalhava como barman, até que começou a sentir pingos de chuva que o fizeram apressar o passo. Chegou à boate, um pouco molhado, e foi até o vestiário trocar de roupa, pouco antes de entrar lá viu de relance uma bela ruiva encostando-se ao balcão. Ela lhe parecia familiar, mas ele não lembrara imediatamente.

Entrou no vestiário com a imagem da ruiva na cabeça e torcendo para que tivesse a oportunidade de atendê-la. Vestiu-se rapidamente e correu até o balcão. A moça, indecisa, ainda não havia escolhido o que beber e foi aí que Luiz viu a oportunidade, sugerindo a ela o drink da casa. Ela sorriu, encarou o barman e disse que "podia ser", mas, antes que ele saísse, ela completou com uma frase que o deixou mais intrigado:

- Conheço você!

Ele sorriu ao ter a confirmação da impressão que tivera, mas de imediato viu dois problemas: não sabia de onde e nem sabia o nome dela. Foi então que mais uma vez a moça foi incisiva, quase como se estivesse lendo a mente dele:

- Anita, nós estudamos juntos no colegial. Você se chama Luiz não é?

- É me chamo Luiz, tinha tido impressão de conhecê-la. Só não me lembrava de onde. Mas como você me reconheceu? Eu mudei muito desde os tempos de moleque.

- Eu não te reconheci de agora, tenho vindo muito aqui ultimamente. Foi numa dessas noites que tive a certeza!

- Mas isso ainda não responde a parte do “como você me reconheceu”, como teve “a certeza”? – falou soltando um riso malicioso.

- Existem pessoas que a gente vai reconhecer pelo resto da vida.

Ele se virou para atender outra pessoa, quase que ignorando o que a bela moça acabara de dizer. Ela já ia lhe dizer umas boas verdades quando viu passando pelo balcão o gerente da boate. Enquanto fazia o drink, olhou para ela e mexeu os lábios torcendo que ela fosse boa em leitura labial. Ela entendeu, com sorte é verdade, o que ele dissera:

- Começo a achar que você está flertando descaradamente comigo.

Aproveitando o momento, Anita abaixou a cabeça, abriu a bolsa, tirou a quantia certa para pagar o drink e já ia se retirando quando sacou da bolsa uma caneta que usou para escrever em uma das cédulas o seu telefone.

Ele pegou o dinheiro e guardou no bolso, enquanto acenou para o colega no caixa, passando a mensagem que a bebida da moça era por conta dele. Depois que a moça partiu foi como se cada minuto durasse uma hora e ele não via a hora de ligar para ela, estava realmente intrigado. Passava um pouco das cinco da manhã quando ele foi liberado, imediatamente ligou para a moça.

***

To be continued...

Nota dos Autores: o texto é uma parceria - do tipo "cada um escreve um pedaço" - entre Fernanda e eu (Fahad). E a continuação é por conta dela postar, já está escrita, ou quase, só falta ela escrever o fim, portanto, se faltar o fim não é culpa minha (risos).

24 de junho de 2011

Nada Justifica!

Eu aprendi quando ainda nem entendia direito qualquer coisa que não se pode justificar um erro através de outro erro. Em um momento ou outro acho que deslizei e tentei fazer isso. Mas venho tentando mudar, pouco a pouco. Diferentemente dos "companheiros" do Partido dos Trabalhadores e da base governista, de uma forma geral.

Acontece que se você abre um jornal ou uma página na internet e encontra uma manchete parecida com essa:

"Prefeito do PT acusado de corrupção foge de ônibus"

E de repente faz uma crítica ao Partido dos Trabalhadores, definitivamente uma agremiação política exemplo de ética e respeito ao erário, logo aparece uma enxurrada de "companheiros" dizendo que Fulano de tal partido fez isso, que Beltrano com ligações com aquele outro partido também fez isso.

Numa ação ridícula querem, em outras palavras, dizer que o fato de Partido A ou Partido B terem, em outros tempos, tido seus nomes envolvidos em escândalos serve como "licença" para o PT e sua trupe estirparem os cofres públicos. Usam supostos "crimes" cometidos por outros como carta branca para cometerem os seus.

Está na hora de parar de querer fazer a sociedade de estúpida - tudo bem que vez por outra a sociedade é mesmo estúpida - ou então eu vou começar a achar que o que acontece de fato é que no fim os caciques do PT usam dos pobres militantes para defendê-los e os pobres militantes agem como pessoas anencéfalas ou então vendados por um sectarismo mais fervoroso que o fanatismo religioso do Islã.

Eu aposto que ainda vai aparecer alguém dizendo: "E o caso de Arruda?", e esses eu respondo que só os ignorantes são convictos que um erro pode justificar outro erro.


Abraço. Boa leitura.

23 de junho de 2011

Encontros e Despedidas

Desligou o telefone depois de algumas horas de conversa. Sempre havia uma novidade, sempre havia uma coisa nova para conversar. Quer fosse sobre um dos novos bolsistas dela que despontava como um prodígio nas práticas experimentais no laboratório, quer fosse sobre a professora de tango argentino dele.

Guilherme e Marina se conheciam desde a juventude, vizinhos de mesma rua no subúrbio de Ouro Preto, estudaram na mesma escola, pegavam os mesmos ônibus e se separaram quando ela, um ano mais velha, mudou-se para Belo Horizente, foi fazer faculdade de Farmácia. Dali em diante eram raros os encontros, mas sempre longos os também raros telefonemas.

E ele sempre tentando esconder o interesse que tinha desde os tempos de criança. Tinha um carinho por ela maior que todo o estado de Minas, mas não tinha coragem de tentar descobrir se era algo mais ou, sequer, de saber o que ela pensava disso. Por vezes isso o machucara, principalmente quando ela vinha falar de alguém em quem estava interessada.

E mesmo depois de tanto tempo, cada um sozinho do seu lado. Ele nunca teve coragem de tocar no assunto. É um caso que esse contador de estórias jamais seria capaz de imaginar e que me faz imaginar o que aconteceria se ela soubesse que todos os reencontros faziam com que o coração dele batesse mais forte e toda despedida fazia o coração dele apertar...


Abraço. Boa leitura.

22 de junho de 2011

Pôr-do-Sol

E o sol ia se pondo...

Toda vez que parava olhando as fotografias velhas do tempo em que podia rir bem alto tarde da noite enquanto tomava um vinho barato e ouvia Caetano Veloso com uma de suas namoradinhas de motel, ele acabava bebendo sem parar tendo lembranças fúnebres de sua juventude.

Era, hoje, um homem bem sucedido. Um apartamento no Leblon, um carro de luxo e um saldo bancário de fazer inveja a qualquer outro companheiro de trabalho. A sutil diferença é que Lucas estava solitário, uma solidão que já durava mais de vinte anos.

Nunca lhe faltaram trepadas, sempre tinha uma outra querendo sair com ele nas noitadas da vida. Mas ele não tinha uma que pudesse lembrar quando fosse reencontrar os amigos de infância, casados e com filhos. E ele tinha um filho, de quem não tinha notícias tinha mais de três anos.

Miguel, seu filho, havia deixado a casa do pai ao completar dezoito anos. Não carregou consigo sequer uma camiseta que tivesse sido paga com dinheiro de Lucas. Foi ao banco e recebeu a herança que recebera de seus avós quando sua mãe ainda era viva. Nunca engoliu o pai, mas este nunca aceitou que o filho fosse parar num lar para abandonados.

Foi à adega, pegou uma garrafa de Vino Nobile di Montepulciano, era impossível identificar a safra, tinha pelo menos uns dez anos de adega. Abriu sem cerimônias, como se fosse um daqueles vinhos baratos de trinta anos atrás. Pegou o telefone e ligou para Sofia, uma prostituta que ele adotara como particular e a quem "doava" quase metade do seu salário.

Ela veio atender seu único cliente, já tinha uma chave do apartamento e era conhecida do porteiro. Ao chegar deparou-se - numa cena quase invariável - com as velhas fotos dispersas por todo o chão do apartamento e Lucas completamente bêbado ao lado de duas garrafas de vinho vazias. Percebeu também o que parecia ser vestígio de cocaína sobre a mesa.

- Tire sua roupa mulher, arrume esta bagunça e depois terei com você - resmungou Lucas como se não tivesse bebido qualquer coisa alcoólica.

Ela o atendeu, sem questionar. E depois partiu, sem se despedir. Ele olhou pela janela, o Sol nascia e ele lembrou de uma velha música de sua juventude: "O Sol nasce pra todos só não sabe quem não quer..."


Abraço. Boa leitura.

21 de junho de 2011

"Quantas vezes a gente sobrevive à hora da verdade?"

Hoje me deparei com vários textos por essa internet, alguns por indicação, outros por casualidade, mas o interessante foi que, apesar dos assuntos tratados serem completamente diferentes, ao final cheguei à conclusão de que todos tomavam por base a mesma coisa: o medo da rejeição.
Um dos textos critica de forma muito bem humorada a sociedade playboysística de Natal. Já um outro, no geral, faz uma análise sobre a “covardia amorosa” masculina. Este último, intitulado “Carta (escancarada) ao homem frouxo”, de Xico Sá, me chamou a atenção para um trecho, quase no finalzinho, que diz o seguinte:

"Rapazes, o amor acaba, o amor acaba em qualquer esquina, de qualquer estação, depois do teatro, a qualquer momento, como dizia Paulo Mendes Campos, mas ter medo de enfrentá-lo é ir desta para a outra mascando o jiló do desprazer e da falta de apetite na vida. "

Como não sou muito diferente de muitas pessoas por aí, postei tal trecho na internet e logo (digo, logo meeesmo), algumas pessoas se manifestaram, adorando e concordando com o que foi dito. Eu também concordo com Xico Sá, em gênero, número e grau, mas não vou mentir dizendo que o jiló não tem sido meu mais fiel acompanhante. As pessoas ultimamente têm tido muito medo de amar e ficam dando a desculpa de que estão muito ocupadas no momento. “Ah, esse ano não, tenho vestibular!”, “agora não, a minha monografia está me matando” ou até mesmo “não dá pra pensar nisso agora, tenho coisa mais importantes pra fazer”. Agora me respondam, estão todos ocupados mesmo, ou estão com medo de amar? Ou melhor, estão com medo de amar, ou de não serem amados? Os homens têm medo do relacionamento sério ou de não serem correspondidos? As mulheres buscam a independência acima de tudo ou, no fundo, tudo o que elas querem é ter alguém de quem depender (e eu não estou falando da parte material)?

Acho mesmo que o grande medo que atormenta a cabeça de todos nós hoje é o medo da rejeição, e é por isso que quando cada um fica no seu quadrado, parecendo forte, se vive mais fácil, porque assim não dá pra quebrar a cara, ou pelo menos não dá pra ninguém ver que quebramos a cara. Esse medo de rejeição fica claro até nas coisas mais superficiais, como foi mostrado no texto sobre a sociedade natalense, a sociedade das aparências. Não que elas não se vistam ou ajam da forma citada no texto sem se sentirem confortáveis com aquilo, até porque se acostumam. É fácil se acostumar com algo quando não se entra em contato com o diferente, principalmente quando se tem medo dele, porque o caminho mais fácil sempre será aquele em que nos deixamos ser iguais aos outros.

19 de junho de 2011

Maldita Rotina!

Ainda que saiba que não vai ficar bom, que não vai me agradar, que não vai me bastar, eu vou escrever. E vou escrever porque isso é a única coisa que eu posso fazer agora. E quem espera um final feliz, nem leia...

***

Meia-noite. Ele deixava o aeroporto muito cansado, apesar de ter sido um voo breve de pouco menos de duas horas. Por sorte não teria que dirigir na viagem que se seguiria em algumas horas. Chegou em seu apartamento e, como de costume, apesar de muito cansado, não tinh1a nenhum sono. Resolveu não dormir até a hora de viajar.

Cinco e cinqüenta da manhã. O motorista da universidade onde ele iria palestrar mais tarde o chamava pelo interfone, dez minutos antes da hora marcada. Ele desceu apressado enquanto vestia a camisa. Deixou o cabelo um pouco espetado, sentou no banco de trás e dormiu.

Oito e quarenta da manhã. Ele descobre que a palestra fora suspensa minutos antes de chegar na universidade. Um curto-circuito danificara o equipamento de som e não havia previsão de quando estaria tudo consertado. Ele resolveu visitar alguns conhecidos que tinha por lá.

Meio-dia e vinte. Um almoço melancólico sentado sozinho numa mesa, era o único solitário de todos que estavam no restaurante, comeu rapidamente e saiu. Foi até a esquina, tinha uma banca de revistas, comprou um cigarro, fazia 20 anos que não fumava. Acendeu, e nem sabia mais tragar.

Duas da tarde. Recebeu uma ligação do motorista da universidade, todo o evento fora adiado. Ele seria levado de volta. Aguardou enquanto o motorista chegava aonde ele estava. Comprou uma água mineral, entrou no carro e partiu.

Cinco e quarenta da tarde. Chegava em sua cidade, não daria tempo sequer passar no apartamento, disse ao motorista que fosse direto para o aeroporto. A correria nos últimos dias era grande. Chegou lá na última chamada para o voo.

Sete e vinte e cinco da noite. Chegava um pouco atrasado para a aula, os alunos já o esperavam. Tomou um café na cantina antes de ir para a sala de aula. Começou a aula e não demorou para perceber que os alunos estavam inquietos. Era algo sobre uma manifestação que acontecia contra o reitor.

Dez da noite. Resolveu dormir num dos apartamentos que a universidade tinha à disposição num hotel da cidade. Estava muito cansado.

***

Seis da tarde do dia seguinte. Ele lembrou que esquecera do aniversário dela. Pensou em ligar, mas achou melhor não. Ficou remoendo. Mas deixou passar.

***

Três dias depois do aniversário. Ele estava na frente do computador, usando seus meios de comunicação quase que pré-históricos àquele tempo, quando subiu uma janela indicando que ela estava online. Ele, antes de qualquer coisa, desculpou-se sem dizer porque, mas sabendo que ela entenderia. Desculpas negadas.

Ele tentou amenizar, falou da correria, do cansaço. E ela retrucou: "Se fosse com você, você ia achar que isso justifica? Seja sincero". Ele não tinha o que dizer. Não conseguia nem falar das imensas saudades que sentia.

Ela era importante, de verdade, mas como dizer isso agora?


Abraço. Boa leitura.

14 de junho de 2011

Quem Vigia os Vigilantes?

Quando todos as deliberações são exauridas, todas as possibilidades de defender uma tese se encerram, quando não existe mais uma instância superior, a quem nós podemos recorrer? O poeta romano Juvenal, pergunta: "Quis custodiet ipsos custodes?" E o os senhores o que me dizem, quem vigia os vigilantes?

A primeira vez que li essa frase, em meados de 2007, foi num quadrinho - diga-se de passagem fantástico e altamente recomendável: Watchmen, de Alan Moore - e não li a sua versão em latim, mas em bom português mesmo, e depois fiquei curioso e tentei no Google, pra ver quem era o autor, foi quando descobri o original em latim. Mais deixemos de lado essa parte...

Ao que interessa, e desperta curiosidade, desde a primeira vez que vi essa frase até começar a escrever esse texto, por incontáveis vezes tenho me feito essa pergunta e de uma forma tão aleatória que por vezes sequer tento encontrar uma resposta. Mas noutro dia, numa dessas mesas de bar da vida, eu respondi sem me dar conta.

Transcrevo, preservando o nome dos presentes:

"- A decisão do STF [sobre Battisti] foi ridícula! - esbravejei.

- Mas, meu amigo, se não podemos acreditar no STF, em quem devemos acreditar?

- Eu acredito ali [falei apontado na direção da universidade], acredito nas cadeiras das universidades."


De imediato alguém me chamou atenção para o que eu acabara de dizer, e eu repeti o que acredito plenamente e mantenho. Mas isso não responde a pergunta inicial, não é mesmo?

Errado!

Responde, sim, e muito bem, diga-se de passagem. É o debate suscitado nas universidades de qualquer natureza, e não só as de Direito. É a renovação promovida pelo novo. É o idealismo latente nos jovens. Mas é aí, justamente no idealismo que nossa juventude é pobre, o sonho da maioria é um carro importado, um apartamento de luxo e uma conta bancária gorda.

Os vigilantes, sejam eles quem forem, só são fortes porque assim os tornamos, porque nós os colocamos num lugar superior e se preciso for os faremos descer e aprender de novo. É uma pena que a maioria dos jovens sejam babacas - inclusive eu por perder meu tempo escrevendo asneiras.

"Enquanto isso nas enfermarias todos os doentes estão cantando sucessos populares..."


Abraço. Boa leitura.

13 de junho de 2011

Num Desses Encontros Casuais

Fitava alternadamente a taça de vinho e o salão, conhecia de si tão pouco naquele momento que não era capaz de diferenciar se estava sonhando ou acordado. Em um rápido olhar sob o salão algo prendera sua atenção, lá estava aquela mulher que ele pouco conhecia, mas com um sorriso deveras atraente, e que sorriso.

E ela veio em sua direção, sentou-se ao seu lado e começaram a conversar como se fizesse mais de meio século que se conhecessem. E a conversa se estendeu por horas e horas, sorriram e choraram, discutiram em um momento e ali mesmo fizeram as pazes.

Chegava a hora do restaurante fechar as portas, pagaram as contas. Cada um pagou a sua. Mas saíram juntos - e por juntos leia-se "lado a lado" -, e caminharam assim até o estacionamento. Lá conversaram um pouco e decidiram tomar café-da-manhã juntos. Cada insistindo para que o outro fosse em seu carro.

Saíram em carros separados. Por um instante era como se um seguisse o outro. Ela tentou ligar para ele mas o telefone estava ocupado, e ele tentou ligar para ela, mas o telefone também estava ocupado. Pararam para o café-da-manhã numa padaria perto da igreja. Desceram e perguntaram simultaneamente: "Com quem você estava falando?"

Após isso olharam feio um pro outro, não acreditavam no que ouviam. Discutiram, e dessa vez sem pazes. A fome passou. Entraram em seus carros e partiram. Sem um beijo sequer.

***

Ele acordou já quase de noite, com muita sede. Foi beber um copo de água na cozinha. Não sabia se tinha sido apenas um sonho, ou se tudo havia acontecido. Foi para a faculdade, e lá cruzou com aquela mulher, ela parecia não reconhecê-lo, e ele fingiu nunca tê-la visto antes.

***

Ela acordou pouco antes do almoço, foi à cozinha e fez a própria comida. Comeu, ainda com aquele cara indigesto na lembrança. À noite foi à uma entrevista de trabalho numa universidade, e por lá cruzou com aquele cara. Ele a olhou estranho e ela pensou: "Cafajeste!"

8 de junho de 2011

Sorrisos (não sou um herói)

O caminho de volta foi bem mais lento do que o de ida. Seus sentimentos refletiam-se no seu corpo. Sentia um peso no peito que o impedia de respirar bem, um nó na garganta e o estômago retorcendo-se.

Parou o carro numa esquina e encostou a cabeça no volante, os olhos fechados, dezenas de perguntas cujas respostas ele já sabia passavam pela sua cabeça. Por que ele não disse o que precisava ser dito antes? Ele já sabia a resposta: sabia qual seria a resposta dela. Um choro, um pedido de desculpas e tudo nunca mais seria como era antes. "Melhor deixar como está."

Covarde! Poderia ter arriscado! Não, não poderia. Há certos riscos que não valem a pena ser corridos. Perder a companhia dela era um risco alto demais....

Mas agora tudo estava perdido. Não havia mais nada a fazer. Por que não disse o que precisava ter dito? Pelo menos retiraria da garganta aquele nó que não o deixava respirar direito.

Não. Agora ela estava feliz e era isso que importava. Ele não tinha direito de interferir dessa forma. "Não é covardia. É abnegação", mentia ele para si mesmo.

"Eu sou apenas um homem, não sou um herói." Ele gostou dessas últimas palavras. Tirou a cabeça do volante e percebeu que a esquina em que tinha parado era a de uma padaria. O dia já amanhecia, a padaria estava abrindo e ele estava com fome.

Entrou e pediu um café. A bebida quente passando pela garganta deu uma sensação boa e aliviou o peso que sentia no peito. "Eu não sou um herói."Repetiu em voz baixa. "Não esperem grandes atos de mim." Sorriu, mas se alguém estivesse vendo seus olhos notaria-os baixos e sem brilho.

Só o que precisava agora de tempo, muito tempo, e mais uma xícara de café.