29 de janeiro de 2011

De volta

O táxi parou na frente da casa. Ele pagou antes de descer e ficou parado na calçada observando a casa enquanto o táxi já ia longe.

O jardim estava tomado pelo pega-pinto e pela carrapateira. As paredes, que um dia foram brancas, agora eram um mosaico formado por todas as cores que o mofo pode adquirir.

Dois anos de distância foram o suficiente para que tudo mudasse. Não só na casa. Na rua ele também não reconhecia nenhum dos vizinhos.

Uma senhorinha simpática - que ele não reconheceu - o cumprimentou com um abraço que o deixou constrangido. Dois anos houveram sido suficientes para ele se acostumar com o distanciamento típico dos britânicos.

"Desculpe, mas não me lembro quem é a senhora". A frase saiu em inglês. “É o costume”. Após a devida tradução, a resposta de que era a vizinha da frente, mãe de seus dois melhores amigos de infância. Um novo abraço, dessa vez caloroso de ambas as partes.

“O que ocorreu?” Nada de especial.

A vida simplesmente continuou. Ela sempre continua, sem se dar pela nossa falta.

Aquela não era mais a sua casa, nem a sua rua. Voltar para a sempre chuvosa Londres tampouco o interessava. Apanhou a mala da calçada e saiu caminhando melancólico

No caminho para o hotel mais próximo, onde decidiu passar a noite, passou pela praça. Num banco dois velhos jogavam gamão. As portas da igreja estavam abertas. Duma banca próxima subia um cheiro de fritura feita com óleo velho. A paisagem e o cheiro lhe trouxeram lembranças de dois anos atrás. Doces lembranças. Aliás, doces não, tinham gosto de pastel frito em óleo velho.

“Certas coisas não mudam”, pensou, “o tempo avança inclemente, sempre adiante, como um enorme trem, mas os trilhos sobre os quais ele anda são sempre os mesmos.”

Pegou a chave da sua casa e deu meia volta. Aquela ainda era sua casa. Ainda era sua rua. O passado estava apenas na sua lembrança (e onde mais poderia estar?), mas por enquanto bastava.

Girou a chave no velho portão. Amanhã terá trabalho para limpar tudo. Estava de volta em casa.

Um comentário:

Fahad M. Aljarboua disse...

Posso dizer que esse conto veio a calhar meu amigo. Por várias razões, mas vou elencar as mais significativas para mim.

Quebrou o gelo de quase duas semanas sem uma vírgula sequer por aqui. E por isso sou grato, tenho estado meio envolvido com um projeto excêntrico e acabei me atabalhoando todo pra escrever pro blog.

E a parte do jogo de gamão me trouxe uma lembrança boa, uma lembrança distante e ao mesmo tempo recente, mas definitivamente agradável. :)


Saudações meu amigo, e aliás, precisamos conversar, colocar as discussões sobre a conjuntura social em dia. =D